O Cristão Como Fiador
No Antigo Testamento, de acordo com a legislação mosaica, um fiador era a pessoa que "intervinha" (heb.: arab) em favor do devedor insolvente e que assumia a responsabilidade pelo pagamento da dívida. Isso o fiador fazia conseguindo o pagamento por parte do devedor, ou desembolsando do próprio bolso a quantia devida.
Passagens que veem a condição de ser fiador de alguém como algo negativo se encontram no livro de Provérbios. Este livro, dentre tantos temas dissertados nele, um deles, que é bem evidente, é a importância da sabedoria (PV 1.22; 4.5-9), assim, ele está repleto de sinais de advertência. A primeira menção do assunto (fiador) se encontra no capítulo 6. Nesta seção temos quatro dessas advertências, a primeira é sobre ser fiador.
Provérbios 6.1-5 Filho meu, se ficaste por fiador do teu companheiro e se te empenhaste ao estranho, estás enredado com o que dizem os teus lábios, estás preso com as palavras da tua boca. Agora, pois, faze isto, filho meu, e livra-te, pois caíste nas mãos do teu companheiro: vai, prostra-te e importuna o teu companheiro; não dês sono aos teus olhos, nem repouso às tuas pálpebras; livra-te, como a gazela, da mão do caçador e, como a ave, da mão do passarinheiro.
A advertência do sábio aqui não deve ser compreendida como uma proibição direta e total contra todo tipo de fiança - o assumir da dívida ou obrigação de outro. No antigo Israel, a caridade para com o compatriota na comunidade hebraica era incentivada com frequência, e a usura (o juro abusivo sobre empréstimos) era condenado (Êx 22.25-26; Lv 25.36-37; Dt 23.19-20; S115.5; Ez 18.8,13,17). Havia também algumas obrigações relacionadas às dívidas de parentes (Rt 4.1-6).
Neste trecho de Provérbios, no entanto, o autor está tratando de forma prática com a decisão impulsiva de assumir a dívida de outras pessoas - do companheiro ou do estranho (v.1). Assumir repentina e impensadamente as dívidas de outros vai resultar, em dificuldades para a pessoa impulsiva e sua família. Uma pessoa generosa não deve permitir que seu coração fale mais alto que o seu cérebro. Porém, o conselho não é contra a generosidade bem pensada e planejada.
Se o fizeste de maneira impensada e se arrependeu, a solução desse problema é fazer de tudo para cancelar imediatamente a garantia dada (v.2-5).
Provérbios 17 17 Em todo tempo ama o amigo, e na angústia se faz o irmão. 18 O homem falto de entendimento compromete-se, ficando por fiador do seu próximo.
Vemos o valor da amizade duradoura. Um verdadeiro amigo é amigo em tempos bons e em épocas ruins. O versículo 18 não contradiz o 17, mas adverte contra o abuso da amizade.
Provérbios 22.26 Não estejas entre os que se comprometem e ficam por fiadores de dívidas,27 pois, se não tens com que pagar, por que arriscas perder a cama de debaixo de ti?
Temos mais uma advertência contra a fiança indiscriminada. A razão dessa advertência é que assumir esse compromisso pode faze-lo perder seus próprios bens.
Não há uma proibição explicita. Só o fato de o sábio estar tratando do assunto mostra que essa atitude não era incomum na época.
Outros textos
Gênesis 43.9, Judá deu ao seu pai a própria vida em fiança pela vida do irmão mais novo, Benjamim, por garantia que o caçula da família voltaria são e salvo de uma viagem ao Egito. E tudo deu certo.
Salmo 119.122 Sê fiador do teu servo para o bem. O salmista conclamou Yahweh a tornar-se seu fiador, ou seja, sua "garantia", interpondo-se entre ele e os ataques dos orgulhosos. Assim também Ezequias (ver Isa. 38.14) pediu que Deus o defendesse da garantia, tradução de um vocábulo hebraico que significa literalmente intercâmbio, em que o garantidor tomava o lugar de seu amigo.
Jó 17:3 Jó está envolto de zombadores (seus amigos) (Jó 16.20), ele se volta a Deus, pede para que seja o seu fiador, um garantidor (cf. Jó 16.19), para que esses zombadores deixem a recusa obstinada deles de reconhecerem a integridade dele (v.10).
No Novo Testamento (Hb 7:22), Jesus intervém como o "garantidor" ou "fiador" das promessas de Deus que nos foram feitas como parte integrante do novo pacto. Em virtude de sua vida, morte expiatória, ressurreição e ascensão à glória celeste, Jesus Cristo tornou-se a garantia divina de que a salvação que foi iniciada em nossas almas, mediante a morte expiatória de Cristo, será necessariamente completada, até a salvação plena, ou seja, até a redenção do corpo. Rom. 8:11: "Se habita em vós o Espirito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará também os vossos corpos mortais, por meio do seu Espírito, que em vós habita".
Esse ensino não é contra servirmos de fiador de outrem, mas contra assumir esse compromisso sem reflexão prévia e sem recursos financeiros suficientes. O problema com a fiança não é o pecado e sim de outra natureza (os riscos envolvidos). Ser fiador(a) é o mesmo que dizer para a outra pessoa: "se você não conseguir pagar sua dívida, pode deixar que eu pago". Pode ser um mau negócio, porém nossa obrigação cristã é, antes de tudo, seguirmos os princípios de generosidade ensinados por Jesus.
Mateus 5.42 "Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes"
Pelo pr. Eder L. de Souza 08/12/2019
Referências
Champlin, N. (2001). Comentário de Champlin versículo por versículo. São Paulo: Hagnos.
Champlin, R. N. (s.d.). Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia. Hagnos.
Comentário Bíblico BEACON. (s.d.). CPAD.
Moura, V. (18 de novembro de 2016). É PECADO SER FIADOR DE OUTRA PESSOA? Fonte: Desafio de ser Cristão: https://www.sercristao.org/e-pecado-ser-fiador-de-outra-pessoa/